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Mercado quer entender a política, diz sócio do 1º “fundo de eleições” | Metrópoles
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Mercado quer entender a política, diz sócio do 1º “fundo de eleições” | Metrópoles

Iniciativa pioneira no mundo, Zaftra Fund direciona investimentos de acordo com informações e análises das eleições no Brasil e no exterior

Opinião

Com cerca de R$ 2,3 bilhões em ativos sob sua gestão, a Gauss Capital, em parceria com o fundador e ex-CEO do Instituto Ideia, Maurício Moura, lançou o primeiro fundo de investimento multimercado do mundo especificamente direcionado por eventos político-eleitorais. A estratégia do Zaftra Fund é impulsionar o investimento em ativos tomando como base informações e análises sobre os processos eleitorais no Brasil e em diversos países.

A projeção da gestora brasileira é que o primeiro “fundo de eleições” do planeta comece a operar ainda no primeiro semestre deste ano, a partir das análises das eleições nacionais na Espanha e na Turquia, que acontecem em maio.

O Fundo de Investimento Multimercado (FIM) é um tipo de aplicação financeira que investe o patrimônio dos cotistas em vários mercados (renda fixa e variável), não apenas em um. Ele pode ser gerido por uma pessoa ou por um grupo de profissionais: o gestor aplica em diversas modalidades de investimento, variáveis de acordo com os riscos e os ativos escolhidos.

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Em linhas gerais, o fundo multimercado é uma opção de investimento conjunto, reunindo diversos investidores. Os ganhos são compartilhados pelos participantes, proporcionalmente aos valores depositados por cada um.

Sócio do fundo Zaftra, Moura deixou a presidência do Instituto Ideia – especializado em pesquisas eleitorais, opinião pública e estratégia política – em dezembro do ano passado. Ele é professor na George Washington University, mestre em ciências sociais pela Universidade de Chicago e doutor em economia e política do setor público pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

“Há uma demanda cada vez maior do setor financeiro por entender os meandros da política e as tendências de opinião pública em nível global”, diz Moura, em entrevista ao Metrópoles. Segundo ele, o objetivo do Zaftra Fund é “prover uma oportunidade aos investidores de ter pleno conhecimento e compreensão dos eventos eleitorais globais, por um lado, e também buscar um retorno a partir desses eventos”.

Em 2022, nas eleições presidenciais brasileiras, o Zaftra Fund funcionou em “caráter experimental”. Pouco antes do primeiro turno, influenciados pela maioria das pesquisas dos grandes institutos, gestores e investidores acreditavam que o então candidato do PT ao Planalto, Luiz Inácio Lula da Silva, poderia derrotar Jair Bolsonaro (PL) já na primeira rodada de votação.

Nesse cenário, as carteiras se mantiveram em posições consideradas defensivas, longe de ações das empresas estatais – diante da expectativa de maior intervencionismo de um eventual governo petista sobre essas companhias. As pesquisas conduzidas por Moura, no entanto, apontavam em outra direção: seria uma disputa muito acirrada, decidida apenas no segundo turno e por margem estreita de votos.

“O mercado, de alguma forma, teve certa euforia [com a confirmação de que haveria segundo turno] porque claramente havia uma percepção mais favorável ao então presidente Jair Bolsonaro do que ao hoje presidente Lula. Essas perspectivas se materializaram entre o primeiro e o segundo turno e nós captamos esse movimento”, recorda Moura.

O ex-CEO do Instituto Ideia será responsável pelas pesquisas político-eleitorais, enquanto Fábio Okumura, sócio e fundador da Gauss, ficará com a gestão da carteira. O Zaftra Fund será disponibilizado para o investidor profissional (com R$ 10 milhões ou mais em carteira) e a aplicação mínima será de R$ 300 mil. Na fase inicial, a carteira não estará disponível para qualquer pessoa – os investidores serão convidados a participar.

Leia os principais trechos da entrevista de Maurício Moura ao Metrópoles:

Como surgiu a ideia de criar o primeiro fundo “de eleição” do mundo e como ele vai funcionar?

Durante muito tempo, eu acompanhei opinião pública para o mercado financeiro, atendendo fundos e bancos, principalmente por meio de análise de pesquisa e análise de tendência eleitoral. A Gauss Capital foi um dos meus clientes e eu comecei a entender como o mercado se posicionava diante das possibilidades de resultado eleitoral. Agora temos uma excelente oportunidade de desenvolver uma oferta de produto que alia essa combinação de análise e expertise eleitoral com uma expertise de trading. Podemos oferecer tudo isso em um serviço único, específico.

Os períodos eleitorais se tornaram relevantes a ponto de interferir em diversos ativos no mercado. Essa importância cada vez maior da política e das eleições influiu para a decisão de criar o fundo?

Influiu totalmente. Há uma demanda cada vez maior do setor financeiro por entender os meandros da política e as tendências de opinião pública em nível global. Temos eleições muito acirradas e de difícil leitura no Brasil e em diversos lugares do mundo. Nós percebemos essa combinação entre eleições acirradas e polarizadas e a percepção do mercado de que isso influencia nos negócios e isso nos motivou a desenvolver o fundo.

Como você enxerga a conexão entre política e mercado de capitais, que parece ter se acentuado nos últimos anos? Qual é a importância de ter um fundo no qual é possível investir com base em cenários eleitorais?

O primeiro ponto é colocar os potenciais investidores em condições de entender melhor e se aprofundar nas principais eleições globais. Ter essa dinâmica através do fundo é muito importante. Trata-se de um fundo de evento: cada eleição é um evento e todos são eventos globais. Então, os investidores terão acesso a um conhecimento global, o que é muito importante. O objetivo final é tentar, de alguma maneira, potencializar um retorno financeiro diante desses eventos. No fim das contas, é uma combinação entre prover uma oportunidade aos investidores de ter pleno conhecimento e compreensão dos eventos eleitorais globais, por um lado, e também buscar um retorno a partir desses eventos. É uma junção entre o acesso ao conhecimento e o potencial de retorno.

No ano passado, durante as eleições presidenciais no Brasil, o fundo rodou em caráter “experimental”. Ao contrário do que indicavam muitos institutos, as suas pesquisas mostravam uma tendência de eleição apertada e decidida apenas no segundo turno, como aconteceu. Como foi desenvolvido esse trabalho e qual foi a reação do mercado após o resultado eleitoral?

Esse é um excelente exemplo de como o fundo vai operar. Nós fizemos uma simulação no ano passado, durante as eleições. A leitura que eu fazia para os meus clientes era a de que teríamos segundo turno, em função do histórico eleitoral no Brasil e das condições dos dois principais candidatos [Lula e Jair Bolsonaro] naquele momento. Também projetamos que seria um segundo turno com uma diferença menor do que outras pesquisas apontavam na última semana. A leitura que fizemos era a de que o mercado, de alguma forma, teve certa euforia [com a confirmação de que haveria segundo turno] porque claramente havia uma percepção mais favorável ao então presidente Jair Bolsonaro do que ao hoje presidente Lula. Essas perspectivas se materializaram entre o primeiro e o segundo turno e nós captamos esse movimento.

Em 2023 e 2024, haverá eleições em países como Espanha, Turquia, Argentina, México, Nova Zelândia, Reino Unido e Estados Unidos. Qual é a sua expectativa para o fundo em um cenário tão movimentado na política internacional?

Temos um cenário de alta frequência eleitoral, como você mencionou, nos dois próximos anos, com vários eventos relevantes tanto do ponto de vista político quanto do ponto de vista de mercado. Também é importante dizer que devem ser eleições muito apertadas em vários desses países, nos quais a oposição está bem posicionada neste momento, como Argentina, Espanha, Nova Zelândia e até a Turquia – onde, pela primeira vez, a oposição parece ter chances reais de derrotar o presidente (Recep Tayyip Erdogan). Na prática, isso significa que aumenta o grau de dificuldade de antever os resultados eleitorais, de ler os cenários. Obviamente, acaba aumentando a expectativa do mercado, que já é grande naturalmente, e o produto atende essa grande expectativa tanto de informação quanto de retorno.