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Histórias de relacionamentos com bonecos ganham a internet | O TEMPO
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Histórias de relacionamentos com bonecos ganham a internet | O TEMPO

Especialistas explicam o que pode estar por trás desse tipo de comportamento e como familiares e amigos podem ajudar

Curiosidades

Nas últimas semanas, o mundo conheceu a história do colombiano Cristian Montenegro, 27. Casado com Natalia Ortiz, uma boneca de pano, o jovem viralizou nas redes sociais com um vídeo postado no TikTok. Nas imagens, ele compartilha o que seria o “nascimento” de um bebê, outro boneco de pano, fruto de sua relação com Natalia. Além do parto, outros momentos com os objetos também são compartilhados nas redes sociais do colombiano, que já acumula 62,4 mil seguidores e mais de 251 mil curtidas na plataforma de vídeos curtos.

Embora a situação dele possa parecer uma brincadeira ou algo muito surreal para ser verdade, a história de Cristian não é a única. No ano passado, uma mineira de Rio Paranaíba também ficou conhecida na internet por causa de seu “casamento” com um boneco de pano. Meirivone Rocha, 57, chegou, ainda, a ter o “parto” do filho com Marcelinho, nome dado ao boneco, transmitido ao vivo por uma rádio da cidade.

Mesmo que essas situações acabem ganhando a internet – seja gerando risadas, curiosidade, seja causando espanto –, casos como esses, em que a realidade parece alterada, podem ser indícios de problemas mais sérios. Ainda que seja necessário avaliar cada caso com detalhes, o psiquiatra Bruno Brandão explica que algumas condições podem explicar esse tipo de fenômeno: “O transtorno delirante persistente, em que a pessoa apresenta crenças fixas e falsas, que não são compartilhadas por outras pessoas e que são sustentadas mesmo diante de evidências em contrário; o Transtorno Dissociativo de Identidade (TDI), condição em que pessoa apresenta duas ou mais personalidades distintas; e até mesmo o Transtorno do Espectro Autista (TEA), já que nesse caso a pessoa pode desenvolver um interesse por objetos inanimados”.

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Munidos da internet e da fama que pode ser alcançada nas redes sociais, as pessoas podem, ainda, encontrar nos likes, compartilhamentos e visualizações estratosféricas um incentivo ou um fator reforçador para que o comportamento se mantenha. Mas, mesmo que exista esse encorajamento, o psiquiatra destaca que o comportamento não pode ser explicado totalmente pela resposta das redes sociais.

A psicanalista Cinthia Demaria reforça o coro, ressaltando que os comportamentos precisam ser analisados de forma separada, porque podem partir de causas distintas e singulares para cada indivíduo. “Não dá para dizer que as pessoas fazem isso por um motivo específico ou que é igual para todo mundo. As causas são as mais diversas”, afirma.

Embora possam ser motivados por inúmeros fatores, essas relações com objetos inanimados não deixam de dialogar com a contemporaneidade. “É importante pensar um pouco no contexto que vivemos. Estamos em um momento em que os objetos têm sido grandes parceiros. Os sujeitos estão cada vez mais prescindindo dos laços com os outros para se apegar a objetos”, observa Cinthia.

Diante de situações como a do colombiano ou a da mineira – que optam por se “casarem” com bonecos –, Cinthia destaca a importância de abrir espaço para compreender o outro. “Precisamos, inclusive, ouvir se isso é um ponto de sofrimento para a pessoa também. Não é uma questão trivial, não porque seja um boneco, mas é uma situação em que o sujeito pode ficar totalmente desprendido do laço com outras pessoas”, pontua. “Se ele não consegue se enlaçar com outros, isso pode significar um monte de outras questões, porque isso mostra que ele tem dificuldade para se enlaçar também com o trabalho, com a família. E essas são instituições necessárias para todo o ser humano, pelo menos o trabalho, que é uma questão de sobrevivência”, acrescenta.

Conforme a especialista explica, é importante que as pessoas próximas busquem entender o que está acontecendo e até que ponto aquele comportamento pode impactar a vida do indivíduo. “Se a família percebe que aquilo afasta o sujeito da vida, do desejo pela vida, porque ele passa a ter outros enlaçamentos, ela deve procurar ajuda profissional, principalmente se a pessoa estiver de acordo com isso”, orienta.

Além da ajuda profissional, é importante não julgar ou ridicularizar o indivíduo. “É necessário entender que, seja qual for o motivo desse comportamento, é muito provável que o indivíduo esteja em sofrimento e tenha vários prejuízos secundários ao transtorno”, ressalta o psiquiatra Bruno Brandão.