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Esportes

Estruturando e-teams

O e-sports está inserido num cenário de grande amplitude e adesão do público jovem - não à toa que já se estuda inserir a modalidade nas Olimpíadas de 2024. Mas, para estar por dentro deste universo, é importante ressaltar que toda relação entre pró-players, times, staffs, streamers e investidores precisa de um olhar multidisciplinar com base na Constituição Federal, no Direito do Trabalho e até no Direito Civil. Para a Dra. Ana Paula Smidt, sócia e CEO do Custódio Lima Advogados Associados, todos os envolvidos precisam estar atentos a negociações de contratos com marcas e investidores, além de processos internos de equipes, aquisição de vagas nas ligas, licenciamento de clubes, direito de imagem, patrocínio e outras tantas formas de atuação. “A crescente das modalidades de e-sports reflete diretamente no número de e-teams que surgem a cada dia, e não pensar na forma de contratação desde o início do projeto pode gerar grandes problemas num futuro não muito distante. Para garantir a segurança jurídica destas relações, é importante ter a estruturação adequada dos contratos considerando cada cenário. Os negociantes precisam estar atentos se é aplicável alguma legislação especial ao caso, como, por exemplo, a Lei Pelé”, alerta a Dra. Ana Paula.

O nome é dado a competições profissionais de games que ocorrem em uma plataforma digital envolvendo dois ou mais competidores (indivíduos ou equipes) em partidas online ou presenciais sincrônicas montadas de forma a permitir o acompanhamento de determinada audiência. Também chamado de esporte eletrônico, o e-sports consiste em torneios e competições de jogos eletrônicos e mesmo não envolvendo atividade física, ele já é considerado modalidade de esporte em todo o mundo. A primeira competição esportiva eletrônica que se tem notícia foi em 1972 entre estudantes da Universidade de Stanford, nos EUA, com o jogo Spacewar. Seu nome oficial foi “Olimpíadas Intergaláticas de Spacewar” e o prêmio foi um ano de assinatura da revista Rolling Stone. A partir de 2010, a popularização do streaming fez o esporte eletrônico crescer rapidamente, sendo a principal fonte o Twitch, lançado em 2011 como site especializado em transmissão de jogos eletrônicos - em 2013, o site registrou 4,5 milhões de visualizações durante a competição de DOTA 2 The International. “Esta década marca, também, a presença física de espectadores nos eventos e o aumento da audiência. Em 2013, o The International vendeu todos os ingressos no Staples Center, em Los Angeles, e em 2014, o League of Legends World Championship atraiu 40 mil espectadores no Seul World Cup Stadium, na Coreia do Sul. No Brasil, League of Legends atraiu mais de 10.000 torcedores ao Allianz Park em 2015 e outros 10.000 ao Ginásio do Ibirapuera, em 2016”, relembra a advogada especialista na modalidade.

Uma equipe profissional de esportes eletrônicos tem uma gestão que passa por manager, coach e analista, além de um elenco com reservas, todos com contrato assinado, que segue um cronograma de treinos e vive em uma gaming office ou gaming house. “Normalmente, uma equipe amadora de e-sports tem treinos regulamentares apenas próximo dos campeonatos e não tem uma gestão estruturada. Muitas vezes nem existe contrato com os jogadores e, com isso, os atletas acabam não tendo muita sequência e nem se dedicando à profissão e a equipe perde sua estrutura e não consegue se manter”, alerta Dra. Ana Paula.

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O QUE NÃO PODE FALTAR NO SEU CONTRATO DE PRÓ-PLAYER

Ser um cyber atleta tem se tornado o sonho de muitos jovens que saem da casa da família muito cedo para vivenciar a rotina intensa de preparação em que estudar o jogo, treinar e fazer streams diariamente com carga horária definida e sem possibilidade de parar e trocar de jogo. O quê, por vezes, começa como brincadeira, torna-se profissão.

Mas para integrar um e-team, é aconselhável que as partes estabeleçam um contrato de trabalho para nortear esta relação. O contrato de trabalho funciona como um acordo e possui diversas finalidades, desde definir o que se espera do contratado até estabelecer as funções que serão exercidas pelo jogador e seus direitos garantidos. Segundo a Dra. Ana Paula, o vínculo empregatício é claramente caracterizado quando existentes os requisitos básicos como pessoalidade, subordinação, onerosidade e habitualidade, por exemplo, quando o atleta precisa se mudar para a Gaming House para treinar com a equipe, tem a obrigação de comparecer a eventos para marcar presença física, artística e pessoal, o que exige a exclusividade com um e-team, além de horários específicos a serem cumpridos, como o tempo de almoço e treinos. “O contrato de trabalho é benéfico para ambas as partes. Aos e-teams, garante que o atleta entenda quais são suas atribuições e benefícios decorrentes desta relação. Já o atleta tem respaldo jurídico e garantia do que foi acordado para essa relação”, explica a advogada.

Segundo a Dra. Ana Paula, o atleta precisa se atentar a algumas cláusulas que o protege como parte mais frágil da relação:

• prazo contratual

• formas de remuneração e adicionais aplicáveis

• multas

• férias

• cláusula compensatória

• cláusula Indenizatória

• período de stream com jornada máxima de 44 horas semanais

Todo tipo de contrato envolve questões burocráticas que se não tiverem a devida atenção podem impactar a carreia do atleta.

ATRASO DE SALÁRIO DO PRÓ-PLAYER

Todo e-team e pró-player, quando estão em uma relação contratual, têm direitos e deveres que devem cumprir. É importante frisar que o pró-player é a parte frágil da relação de trabalho e, por isso, tem seus direitos trabalhistas garantidos por lei. Toda empresa assume um risco presumido. Sendo assim, independente do e-team estar passando por um bom momento, com grande aferição de lucro, ou estar sendo afetado por uma crise econômica que atinge todo o País, é sua obrigação realizar o pagamento das verbas trabalhistas de seus empregados, segundo a Dra. Ana Paula. “Quando o empregador deixar de cumprir suas obrigações como pagar o salário, a remuneração pela cessão do direito de imagem ou qualquer outra verba, como premiação, 13º salário ou mesmo FGTS, abre precedente para que o atleta se recuse a participar de treinos oficiais e campeonatos enquanto não houver o acerto da remuneração”, alerta.

A Dra. Ana Paula ainda chama a atenção para a possibilidade de cenários possíveis nessa situação - o atleta pode ajuizar uma Reclamação Trabalhista de Rescisão Indireta, já que o contratante não está cumprindo com sua parte do contrato. No caso do e-team decidir rescindir o contrato com o atleta alegando justa causa, o mesmo pode reverter a situação e receber todos os direitos que lhe caberiam numa demissão sem justa causa. “É de extrema importância que o atleta conheça seus direitos para que possa vivenciar a relação de forma harmônica entregando os resultados esperados”, finaliza.

Sobre Ana Paula Smidt

A advogada Ana Paula Smidt é sócia e CEO do Custódio Lima Advogados Associados. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, possui especialização em Direito do Trabalho e Direito Previdenciário Empresarial pela Escola Superior de Advocacia.

Atualmente, é diretora jurídica da Associação das Empresas de Parques de Diversão do Brasil (ADIBRA).

Ana Paula desenvolveu sua carreira profissional prestando consultoria jurídica a empresas e pessoas em questões relacionadas à segurança e saúde do trabalho, melhoria das relações sindicais e estratégias de prevenção ou redução de passivo trabalhista.

Graças à sua experiência, se tornou educadora executiva e palestrante e seus encontros já impactaram milhares de profissionais em todo o Brasil.