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Opinião

Não vou falar do camarada que os petistas arrumaram para atacar Moro

Por Mario Sabino

Nem do presidente da República que arrasta asa para ditador, nem do conto do vigário do carro popular que não é popular coisíssima nenhuma.

Não vou falar do camarada com nome de mafioso, cara de mafioso, fala de mafioso, história de mafioso, mas que jura que não é mafioso, que os petistas inventaram para atacar Sergio Moro. Não vou falar do presidente que arrasta asa para ditador. Também não vou falar da vigarice do carro popular que não é popular coisíssima nenhuma. Vou mudar de assunto.

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Li consternado que os produtores de vinho da região de Bordeaux estão arrancando quase 10% das suas vinhas, por causa da queda das vendas. Bebe-se cada vez menos vinho na França, 30% a menos do que dez anos atrás, e as vendas para a China não retomaram os mesmo patamares pré-pandemia. É preciso diminuir a produção para melhorar o preço.

Quando falo em vinho, quero dizer vinho tinto, porque vinho branco é como chocolate branco — uma variação que só serve para enjoar a pessoa, com todas as suas consequências fisiológicas desagradáveis, das quais a dor de cabeça é a menos incômoda. E, quando falo em vinho tinto, quero dizer Bordeaux.

Não existe nada no mundo do vinho igual a um bom Bordeaux. Alguém perguntará a este italiano: mas e um Barolo de primeira linha? Chega perto. Mas é como substituir uma tela cubista de Picasso por outra de Georges Braque. Não é a mesma coisa, a menos que você esteja no Piemonte. Aí, um Barolo é obrigatório. Fora do Piemonte, se puder, prefira um Bordeaux.

Se são os mestres na arte de produzir esses néctares (substantivo empoeirado como as garrafas das adegas de antigamente), por que os franceses estão bebendo menos vinho? Por duas razões: as refeições familiares, nas quais se abria normalmente uma garrafa, deixaram de ser regra. As pessoas em casa reúnem-se menos em torno de uma mesa e, quando o fazem, é por muito menos tempo. Cada um almoça ou janta em horários diferentes — e, no mais das vezes, em frente a um monitor de computador ou de televisão.

O segundo motivo é o encolhimento da própria família tradicional. Casais compram e consomem mais bebidas alcoólicas em casa do que solteiros e pais e mães de famílias monoparentais. A transmissão doméstica da cultura do vinho foi afetada por essa mudança social. Com isso, a maioria dos jovens não aprende a gostar de vinho. O desastre vínico convenceu-me a ser a favor da família tradicional.

Feitas as contas nesse país de matemáticos que é a França, concluiu-se que sete em cada dez franceses na faixa dos 20 anos não aprecia o sabor do vinho. “O caráter cultural do vinho é evidente: começar a beber um bordeaux ou um bourgogne não é uma questão de gosto, é o resultado de uma proximidade com o vinho, principalmente em família”, resume Denis Saverot, editor de La Revue du Vin de France.

Não tenho pretensões a ser sommelier (inclusive porque é como se chamava, séculos atrás, o condutor de bestas de carga) e acho de uma chatice quântica esse negócio de visitar vinícola e fazer degustação. Vinho, para mim, é coisa familiar.

Quando era pequeno, eu tomava sangria na casa do meu avô romano, que tinha sempre uma garrafa aberta à mesa. Hoje, esse tipo de proximidade com o vinho daria prisão a quem serve sangria a crianças. Em mim, ainda bem, deu num sessentão que gosta tanto de vinho, que fica nauseado quando ouve que gente de quinta categoria entorna goela abaixo garrafas de Bordeaux caríssimo, como se estivesse bebendo cachaça. Essa gente não gosta de vinho, gosta é de embebedar-se com produto de roubo. De cair de bêbada.

É melhor eu parar por aqui. Jurei que hoje mudaria de assunto e não adentraria as vinhas da ira.

Veja aqui:

https://www.metropoles.com/colunas/mario-sabino/nao-vou-falar-do-mafioso-que-os-petistas-arrumaram-para-atacar-moro